Obesidade e Câncer

No livro Anticâncer do dr David Servan Schreiber encontramos:

Um dos maiores mistérios da epidemiologia moderna, fora o câncer,  diz respeito à obesidade. Depois do tabaco, a obesidade é o segundo fator de risco para o câncer. Recentemente se compreendeu que a obesidade e o câncer tem uma raiz comum. Mas examinemos primeiramente o enigma da obesidade.

Gérard Ailhaud e um grupo de pesquisadores franceses se perguntou porque a massa de tecido gorduroso nas crianças com menos de um ano dobrou entre os anos de 1970 e 1990 nos Estados Unidos. Em um livro fascinante que conta a aventura de suas descobertas, Pierre Weil – ao mesmo tempo bioquímico e agrônomo, além de membro do grupo de pesquisa [e também fundador da UNIPAZ] – relata a observação de seu amigo Ailhaud: “Numa idade que vai de 6 a 11 meses não se pode incriminar o McDonald’s, a comida fora das refeições, a televisão e o déficit de atividade física”.

Não, os bebes não estão superalimentados. Estão lhes dando a mesma quantidade de leite de sempre, quer seja materno ou artificial. Gérard Ailhaud e seu colega Philippe Guernet conseguiram demonstrar que a modificação na natureza do leite a partir de 1950 é que seria responsável pela obesidade dos bebes. Esse desequilíbrio age ao mesmo tempo sobre o crescimento de células adiposas e sobre células cancerosas.

A partir dos anos 1950, a demanda de laticínios e de carne bovina aumentou de tal maneira que os criadores tiveram que contornar a imposição do ciclo natural de produção de leite e reduzir o espaço de pasto necessário para alimentar um bovino de 750 kg. As pastagens foram então abandonadas em favor da criação confinada. O milho, a soja e o trigo, que passaram a constituir a alimentação principal dos animais, quase não contem mais omega-3. Eles são, por outro lado ricos em omega-6. Os ácidos graxos ômega- 3 e omega-6 são ditos essenciais por não poderem ser fabricados pelo corpo humano; consequentemente, a quantidade de omega-3 e omega-6 em nosso corpo decorre diretamente das quantidades presentes na nossa alimentação. Estas dependem, por sua vez, do que absorveram as vacas ou as galinhas de onde obtivemos nosso alimento. Se elas comem capim, então a carne, o leite e os ovos que nos oferecem são perfeitamente equilibrados em omega-3 e omega-6 (um equilíbrio próximo de 1/1). Se elas comem milho e soja, o desequilíbrio em nosso organismo alcança taxas atuais de  1/15 ou até 1/40 para alguns de nós.

Os omega-3 e 6 presentes em nosso corpo estão em permanente competição pelo controle de nossa biologia. Os omega-6 facilitam a estocagem nas células adiposas (gordura), a rigidez das células, a coagulação e as respostas inflamatórias às agressões exteriores. Eles estimulam portanto a fabricação de células adiposas desde o nascimento. Os omega-3, ao contrario, atuam na constituição do sistema nervoso, tornam as células mais flexíveis e acalmam as reações de inflamação. Limitam também a fabricação de células adiposas. O equilíbrio da fisiologia depende estreitamente do equilíbrio entre omega-3 e omega-6. Pois bem, essa relação é o que mais mudou na nossa alimentação em cinquenta anos.

Não são apenas os bovinos. A alimentação das galinhas também se transformou inteiramente, e os ovos – alimento “natural” por excelência – deixaram por completo de conter os mesmos ácidos graxos essenciais de cinquenta anos atrás. A doutora Artemis Simopoulos, grande nutricionista americana de origem grega, dirigiu o departamento de pesquisa de nutrição do Instituto Nacional de Saúde americano. Ela publicou um trabalho curioso no New England Journal of Medicine: os ovos produzidos pelas galinhas criadas com grão de milho (quase universal hoje) contem vinte vezes mais omega-6 do que omega-3. Em compensação, suas quantidades são quase iguais na fazenda onde ela cresceu na Grécia.

Paralelamente à profunda alteração na sua dieta alimentar, o gado é por vezes tratado com hormônios como o estradiol e o zeranol afim de acelerar seu aumento de peso. Esses hormônios se acumulam dentro do tecido gorduroso e são excretados no leite. Recentemente, um novo hormônio sintético foi criado nos Estados Unidos para estimular a produção de leite – o rBGH (recombinant bovine growth hormone, também chamado BST). Ele age sobre as glândulas mamarias da vaca e permite aumentar a produção de leite de modo importante. O rBGH ainda está proibido na Europa e Canadá, mas tendo em vista acordos comerciais internacionais este hormônio corre o risco de ir parar em nossos pratos via importação de produtos derivados do leite americano. Não se conhecem os efeitos do rBGH sobre o homem, mas se sabe que ele favorece a produção de IGF na vaca, que esse IGF vai parar no leite, e que ele não é destruído pela pasteurização. O IGF é um fator importante na estimulação das células adiposas. Como se viu, é também um acelerador do crescimento dos tumores cancerosos.

Finalmente, a passagem da forragem para a combinação soja/ milho apresenta ainda um outro inconveniente. Um dos mais raros compostos alimentares de origem animal que tem uma eficácia possível contra o câncer é um ácido graxo chamado CLA (conjugated linoleic acid). A equipe do professor Philippe Bougnox, oncologista e pesquisador do INRA em Tours na França , foi uma das primeiras a colocar em evidencia o papel do CLA contra o crescimento das células cancerosas. O CLA está presente principalmente nos queijos, mas unicamente se provierem de animais alimentados com forragem. Assim, ao alterarmos a dieta das vacas, das cabras e das ovelhas, nós eliminamos a única particularidade anticâncer que elas poderiam nos oferecer.

O Departamento de Epidemiologia de Harvard mostrou em 2006 que o risco de câncer de mama nas mulheres em pré-menopausa é duas vezes mais elevado entre as que consomem carne vermelha mais de uma vez por dia do que entre as que comem menos de três vezes por semana. Poderíamos portanto dividir por dois o câncer de mama simplesmente agindo sobre o consumo de carne vermelha. É também possível que o risco se deva em parte ao fato de que os grandes comedores de carne consumam muito menos alimentos anticâncer (que são todos vegetais).

Devemos também nos alertar para as consequências destes hormônios aplicados aos animais. Eles são excretados através de fezes e urina , os quais vão para os esgotos, alcançam os rios e depois mares e oceanos. Afetam os peixes provocando mutações genéticas e por fim alteram os cromossomos dos humanos que se alimentam deles. Como exposto no tópico Cem Anos de Mentira.

O tratamento de águas não consegue eliminar os hormônios da água. Pelo menos os tratamentos convencionais a base de produtos químicos.

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